quinta-feira, julho 31, 2003

O torpor esquecido

Vem a mim
o prenúncio do mundo.
Reticente,
suspirando magoado
da calmaria da luz...
Volátil, efémera,
a premência fugaz,
o torpor esquecido
de amar...
Eterna procura frustrada,
audaz de intenção
de altiva atitude,
sobranceira
mas triste,
negando o seu reflexo,
soletrando magnífico e vil
a pena de estar só,
aqui...
Na cidade vazia de Agosto
por margens iluminadas
o lusco-fusco das ausências.
A noite quase queima
os horizontes indistintos,
os caminhos da tua alma...
Sem rumores nem os queixumes,
ténues e opacos,
não vislumbram
as incertezas e os medos,
descobertos,
decifrando,
o outro lado do mundo.

sexta-feira, julho 25, 2003

Palavra que se avista

Um sopro de alma, o que uma palavra dá,
textos como folhas de outono,
Páginas sem vida, formas que dão vida,
Sem o querer de querer, não se importam de dar.
Milagre, mito de invenção, fugaz imaginação,
labirinto de saudade, falta de vir a ter.
Lágrima voraz, riso sem contenção,
coração partido, dor manifesta, exige a sua parte.
Mar, o meu mar, a vista que se avista,
viagem sem tempo nem horas de chegar,
malas vazias de partida, vagando sem parar.

quinta-feira, julho 24, 2003

Um (só)

Os olhos, plenos de tudo, não enganam, a vontade, o desejo. As mãos, fortes e delicadas, arrepiam a pele, desenham contornos, desenham palavras, gritam silêncios óbvios no teu peito, bronzeado e quente, acompanhando, juntando-se ao coração, ao bater das horas que passam com vagar, vagarosamente apreciando, lentamente, beijando os lábios, os nossos, ardentes, murmurando, qualquer coisa, suspirando de prazer, sós, os dois, pelo toque, carícia e volúpia, ondulando, imaginando, voando, tremendo, enrolando, suplicando.
Os dedos, multiplicando-se, dividem-se, separam-se, tentando abarcar o que a vista alcança, o que o sentido, premente, pressente, conquistando, navegando, nos recantos escondidos, as superfícies belas, virgens, oferecendo o corpo, a alma, tudo o que mais vier, tudo o que mais pedir, tudo o que mais se sentir, mais e mais.
Os olhos, as mãos, os dedos, plenos de tudo, não enganam, a vontade, o desejo, o arrepio, o bater, o murmurar, o tocar, o imaginar, a súplica, o sentimento, que nos une, que nos consome, que nos faz, um só, tudo num só.
Acordo. Estás aqui.

terça-feira, julho 22, 2003

Tenho alguém que me espera

Tenho alguém que me espera.
Para lá do outono que voou pela janela,
Nada deixando além do meu nome.
E o teu, não me lembro, da cidade que não vi,
Pois só a ti eu deixei,
O que não tinha,
Como no corredor vazio, só a luz entrava,
E iludia a ausência, de quem espera por nada,
Rebelde pela sua causa, sem chama nem valor,
Sem arbítrio ou condescendência.
Alguém que sei que tive, nos meus braços e mais ninguém,
Nem outro verão ou primavera, nem vento que separasse,
Nem ponte que unisse, nem mundo que ruísse,
Não teve força nem vontade,
Esperava clamores de vitória, honras de estado.
Mas o meu coração não tem protocolo,
É terra de ninguém,
Onde não há vida,
A não ser a que despertaste e chamaste,
Onde deixaste silêncio,
E nada mais se ouve que o bater, oco, sincopado, compassado,
como dois dedos na mesa, contando as horas, os minutos,
sem segundos momentos, nem novas oportunidades.
O silêncio de alguém nem ficou para se ouvir,
Olhando-se de longe, fugindo pela calçada,
Com passos calados e tímidos, por entre as frinchas e feridas,
Abertas, ardendo, do meu coração.

segunda-feira, julho 21, 2003

Como Ondas...

aquelas pequenas coisas
que no teu dia de sol voam
tão depressa falam suavemente
em braços descobertos e calor
à noite junto ao rio
descobrem-se e riem
como ondas molhando o cais
como ondas do teu cabelo
como ondas no ar
levando o teu som ao meu mar
aqueles dias de verão
num inverno interminável
num momento de vários instantes
minutos contados ao segundo
descendo a avenida
quase voando
quase cantando
quando chorando
molhando a cara
salpicando o dia
como ondas na beira mar
como ondas e espuma nos pés
o teu corpo feito em curvas
sentidos ascendentes e carnais
sem resistências
eu
a mim próprio
a ti
numa onda de excitação
numa vaga de vontade
numa maré de bem querer
num mar de sentidos
num oceano maior que nós
numa lágrima não contida
escutando
tocando
mergulhando
emergindo
acariciando
como um onda.

quinta-feira, julho 10, 2003

Chuva segura

Segura, a tortura, perdura
Na sombra, o silêncio aproxima
De perto, de mais, intenso
Cantando, baixinho, suspirando
Aberta, a ferida, por sarar
Perdida, calada, sem voar
Temendo, o assombro, ansiedade
Velada, a vergonha, escondida
No manto, encanto, protegida
Vendida, entregue, rendida
À dor, fervor, amor, vazio, na casa, assusta
Nuvem, a chuva, não passa
Nem traça, o caminho, estreito
Subindo, fugindo, sem chão
Ao tecto, mais alto, no céu,
A linha, o mar, o horizonte
Ténue, longe, a fantasia
Mentir, sem ver, sentir
Presença, a tua, comigo
Perto, colados, calados
Tremendo, temendo, querendo
Morrer, matar, amando
Algures, no mundo, perdidos
Esperando, a chuva, que não passa.

quarta-feira, julho 09, 2003

Empty moon

Maybe the ocean flow in to your mind,
Se o teu corpo for de água,
Maybe alive in another planet,
Que seja do mar,
Where the lost souls find their way,
Onde eu possa mergulhar,
Where my love sufocates the empty space,
Deixar-me afogar,
Seeking for something, beeging air to breathe,
Não pedir para me salvar.
Burnig my heart, loosing footsteps on the stars.
Quando o verão era azul

Nada mais e tudo importava
E no mar toda a alegria flutuava
Voava no etéreo pôr do sol
E a areia quente do fim do dia
Salpicada e leve
Nas mãos e no rosto
A pele morena e as gaivotas
Dos pescadores, que não paravam
Cavalgando ondas e noites
Brincando e pulando
Na espuma dos nossos dias
De mãos dadas olhando a manhã
Por nada esperando
E tudo querendo
Por ti desejando
A maresia e a calma
As marés e a lua
Iluminando e esquecendo
O medo do escuro, nas dunas
Quando o verão era azul
Os dias não mais terminavam
E para sempre duravam
Por nós vivendo
Por nós cantando
Por nós sonhando
Teresa

terça-feira, julho 08, 2003

Fragmentos do nada

Entregue(s) a Si

Vagamente, lentamente, lembrava-se de tudo e não via nada, nas nuvens não conseguia tocar. E nas pessoas...Tão indistintas por fora, tão semelhantes como largo é o abismo que separa o mundo, aquele que ele criou, o que todos constróem e desfazem.
Vagamente, este era o seu mundo, recordando-se de outras horas em outros tempos.
E no mar tocava e nada sentia, nem alegria nem tristeza, nem medo nem coragem. E o mundo girava, tão rápido que de longe parecia parado,
como que aguardando o fim.
Não existes!, disse ao espelho, mudo e absorto em si, inanimado, ao que Ele nada retorquiu, com medo de negar-se a si mesmo, como se neste momento pensasse que não pensava, que não se interrogava. Só preciso de quem me possa tocar, desabafou repudiando o seu reflexo.
E nós, de repente compreendemos que estávamos sozinhos e na penumbra não vislumbramos o dia, nem Ele, que sabia o que era o dia e a noite e a madrugada. Ele, perdido como a escuridão fugindo à luz, temendo o inevitável, pela primeira vez teve medo, como nunca sentira. Cada coisa no seu lugar é o mundo do avesso, as vontades diluídas na descrença, a ausência de futuro. Ele não percebia que o reverso é a prova da face e isso entristeceu-o, culpou-o, amarrou-o a si mesmo, pois não vira o que fizera. Fez mal pelo bem, o bem pelo mal e chorou, naturalmente.
O que fiz? Perguntou ao espelho, que respondeu Nada, Tu não fizeste nada, todos fizeram o que Tu devias fazer, eles disseram-Te o que lhes devias dizer, eles amordaçam-te quando querem, não ages nunca, mesmo quando alguns pedem; Tu pensas o que todos eles pensam, Tu fazes o que eles fazem, Tu estás onde eles estão. Ou Será tudo ao contrário?
Assustado, perguntou: - Então quem sou Eu? E ele nada respondeu...
Perplexo, vagueou e perplexo tentou entender a dor. A dor de não saber como pode doer se nada não pode doer, terá pensado. Mas não parou e não descansou até O reconhecerem, todos aqueles de quem falavam, no mar, na terra, no ar, nas estrelas, todos se apagavam, ocultando o seu caminho, dissimulando a sua passagem.
E Ele desistiu, pois mais nada conhecia que toda a parte e em toda a parte, ninguém O reconheceu. Deixou-se ficar, deixou de ouvir, a ninguém respondeu, pois ninguém O chamava.
E tudo mudou. A penumbra não mais fugia ao dia, e a noite não mais cessou, pois já era tudo, as nuvens cobriram a terra e toda parte era outra toda igual Ninguém O procurava, ninguém O perdera, não havia falta do que nunca lá estivera, percebendo, enfim, que não fazia sentido apenas para quem Nele depositava fé, apenas para quem Nele se orientava, por falta ou fraqueza, por escolha ou atitude, por reveses ou bandeiras.
E agora? Ficam entregues a si...! interrogou-se ao espelho, ao que este, sem pensar, num ápice, respondeu: Sempre estiveram...
Vive!

ou a música do mundo...

Ondula, movimenta a tua beleza,
corta o ar com um suspiro,
fecha o silêncio com um sussurro,
não dês nada, não te contenhas.
Fala, repete o que ouviste,
inventa uma frase, estimula o meu intelecto.
Não quero nada, porque te detêns?
Grita, expressa os teus sentidos,
repele os teus medos, exorciza o desespero,
não queiras nada, não te atrevas a parar.
Transforma-te, supera-te,
arranca-te das entranhas,
faz a pele arrepiar, levanta as mãos ao céu,
chora de raiva.
Ama, vive, canta:

Oiço música até mais tarde,
Espuma, bossa nova, num divã,
Dançando com a luz da rua,
Esperando o por-do-sol de amanhã.
No silêncio, abre a porta,
A fundo do mundo a tua voz,
Jantar, o vinho, a companhia,
Suave, acalma, estamos sós.
Na janela, um riso de lua cheia,
Não tardou a me animar,
Do estio, esperando o seu calor,
Do verão que não posso avistar.
Na torre, o vidro aquece ao sol,
Alegria cintilante sobre as águas,
Pela camisa, a tua mão no meu peito,
Afasta, afoga todas as mágoas.
Todos os amigos, as músicas,
Esperam abaixo, junto ao mar,
Gargalhadas e risos como os nossos,
Soltam-se na ânsia de amar.
O tapete estendido, como o mar,
De palha, as conversas que ardem,
esquecemos, o corpo com preguiça,
que os minutos não contam,
as horas que tardem”