sexta-feira, agosto 26, 2005



Cárcere (escondido da luz)

Esconder a pele e os ossos
num sitio só deles,
E depois a fúria
Arranhando qualquer coisa como a alma
Dorida, em sangue salpicado de cores indeléveis,
Recortando figuras e silhuetas nas sombras das palavras,
Indistintas, intransponíveis, inexplicáveis
Como acidentes felizes do acaso, à espera de acontecer,
Murmurando canções alheias, de sonora lascívia,
Decapitando as agulhas do vinil, trilhando mãos demasiado pequenas para este mundo,
Com êxtase inexplicável e sádico.

Não te podes esconder de mim.

quinta-feira, agosto 18, 2005


Deixa entrar o jazz


No passeio que acompanha o mar
O dia suspende-se em melancolia,
Perdido numa atmosfera de surdinas,
Uma sensação de eterno retorno,
Música de um tempo ausente
Cola-se à pele como o inevitável balançar das ondas,
Aspirando a um contacto leve com o mundo.

Oiço-te aqui e agora,
De olhos içados ao som profundo,
Voando centelhas de paixão e música de solstícios.

Deixa entrar o jazz,
Em sucessivas vagas,
Expondo as entranhas de um coração amordaçado,
Libertando os relicários de demónios que conservas
Como amuletos de má sorte.

Afinal, oiço-te aqui e agora.
Como sempre.

terça-feira, agosto 09, 2005


Je fais de toi mon desire

O desejo é cor dorida e noctívaga
Coisa de minúcias e murmúrios
Que se espreguiça no amainar da manhã,
Sorrindo das memórias longínquas de ontem
Assumindo formas invulgares e inesperadas
Reflectidas como sombras perdidas no escuro
Ouvindo-se como um grito arrancado de uma paixão furiosa
Afundar-se numa boca de metro qualquer,
Insinuando-se nas esquinas mal escondidas da penumbra.

Faço de ti o meu desejo egoísta de amar sem limites,
Amordaçar gemidos de prazer,
Guardá-los só para mim
E ardendo-me as asas, subir às nuvens.