quarta-feira, dezembro 31, 2008


O dia seguinte

No último dia prometo,
Sem angústias e sem pressas,
Alcançar cada instante,
Proteger-me das feridas,
Do choro arrependido,
Dos suspiros inquietos e intermitentes.

Que tudo seja claridade e lucidez,
As palavras sejam simples mas saciem, sem remédio,
O fluxo e o refluxo das vontades escondidas,
Deixem marcas de fúria e desejo,
Indeléveis ao esvair do tempo,
Inconsequente, incontrolável, irresistível,
Como o mar que se aproxima e inunda todos os medos,
Do cais à minha janela.


Passa, lento vapor, passa e não fiques... Passa de mim, passa da minha vista, Vai-te de dentro do meu coração, Perde-te no Longe, no Longe, bruma de Deus, Perde-te, segue o teu destino e deixa-me... Eu quem sou para que chore e interrogue? Eu quem sou para que te fale e te ame? Eu quem sou para que me perturbe ver-te? Larga do cais, cresce o sol, ergue-se ouro, Luzem os telhados dos edifícios do cais, Todo o lado de cá da cidade brilha...

In “Ode Marítima”Álvaro de Campos, in "Poemas"