terça-feira, julho 31, 2007


Ainda não me rendi

Todas as dúvidas acordam pontuais,
Às meias horas nocturnas,
Deslizando em gotas perfeitas de suor,
Decorando a ponta dos dedos,
Ao som da música incessante dos sonhos.

Ainda não me rendi,
Não parei de lutar, nem de falar
De punhos cerrados e sorriso aberto,
Decifrando olhos semi cerrados,
Corações disfarçados de gente.

Mais um movimento certeiro
E mais um fio de sangue,
Traçando na cara as linhas das minhas certezas,
Marcando os passos incertos dos meus ideais,
Moldando a feições das palavras.

Ainda assim, não me rendi.

segunda-feira, julho 30, 2007


O dia mais quente do ano

O dia mais quente do ano
Começava em sufocos de calendário
Há mais luas do que aquelas que nós víamos
Á medida que o amor arrefecia
Enquanto a amizade se pintava de matizes desconhecidas.

Naquele dia,
A esplanada estava vazia
E o passeio escaldava-nos as pernas,
Espreitando a sombra das escadas,
Descobertas,
Em preto mediterrânico e gelado de morango
Cruzadas a 45 graus,
Aquecendo os risos impacientes.

A brisa perdera-se nas esquinas da calçada,
E não eram ainda nem onze horas,
Nem tempo de fugirmos ao estio,
Apenas aos braços um do outro,
Reanimando o que nós insiste em não morrer.

Dizia-se ser o dia mais quente do ano,
Mas naquele mármore fresco do pátio,
Borbulhava o sangue e os lábios.
Atenas - Grécia

sexta-feira, julho 20, 2007


Castigo

O mundo trespassado pelo tempo,
O ódio e o amor flutuando no movimento dos passos,
Dizendo, devagar, o que acontece muito depressa,
Nos ínfimos segundos de atenção
Esquecidos,
Seguindo o norte,
Procurando os cantos à esfera das palavras,
Misturadas na terra que se levanta
E se inunda na falta de chuva e cor,
Esperando o castigo de nada se esperar,
De tudo acontecer.




“(...)Ninguém disse nada. Fomos dormir. Essa noite foi como as noites de muitos meses que se seguiram. Havia um peso fundo dentro de nós a puxar-nos para o nosso interior mais negro(...)”
In “Cemitério de Pianos” de José Luis Peixoto.

segunda-feira, julho 16, 2007


Uns segundos na marginal


A longínqua lucidez das sombras
No clamor da noite, cresce
Adiada, sumida, perdida
Pela transparência das luzes ténues
Tremendo até à infíma dispersão
Como astros viajantes
Crisálidas suspirando entre metamorfoses
Descobrindo a espessura das cores e dos sonhos
Percorrendo pomares de perfume tropical
Num caminhar de bossa nova.

Agosto é já amanhã,
Na marginal.

sexta-feira, julho 13, 2007


Travessia

A travessia perde-se nas correntes e vagas,
Nos equívocos dos ventos e sopros em sal marinho
Cruzam-se os nós, os laços,
Os beijos firmemente seguros
Desprendidos, soltos, submersos
Voando sobre o imenso azul,
Precipitando-se nas profudenzas das palavras,
Purificando imperfeições,
Escrevendo o futuro nas auroras que despontam,
Que derramam a luz sobre a pele,
Emudecem o mundo...

quinta-feira, julho 05, 2007


Tudo se torna mais claro

Cai enfim,
Tudo o que disseste, balouçando sobre o vazio
Corda esgaçada, silenciosamente parte
Nos instantes velozes
Em que uma boca fugitiva
Fere, engana, desmascara,
Olhos feridos, abertos
Volteando, em euforia,
A verdade afogando-se em álcool
Perfidamente ministrado
Na ausência e no engano.

Tudo se torna mais claro
Quando nada é desmedido,
Quando a bruma e as trevas
Brilham mais que todas as manhãs.
Amsterdão - Holanda



Nem ópio nem morfina.
O que me ardeu,
Foi álcool mais raro e penetrante:
É só de mim que ando delirante...
Manhã tão forte que me anoiteceu.
Mário de Sá-Carneiro in “Alcool”

terça-feira, julho 03, 2007


Náuseas


Na subtil poeira de outros enganos
Vejo-me nos destroços deixados
Dos bandos de quimeras perdidas ao longe.

Dou-me no horizonte que arde,
Escavadas as cinzas e o desencanto,
Resvalamos nos precipícios iluminados
Em ânsias ancoradas em ruínas e vertigens.


Amantes inconscientes
E distantes,
Como dois desconhecidos.