sexta-feira, março 26, 2004
A noite ardendo
Hoje já não posso ser assim.
Demasiado avesso à melancolia,
Nunca dizer nunca,
Sentir o que de nós se espera.
Outras memórias vêm à tona,
Perdidas em movimentos redundantes
Resplandecendo na obscuridade intensa:
O jazz polido da tua voz,
Uma comédia de algo que se intromete e arrebata
A noite ardendo só, deflagrando risos
Celebrando euforia.
Magnífica respiração ofegante,
A invejável simplicidade da respiração
Cruzar sopros inconciliáveis.
As diferenças dissimuladas.
A insistente atenção a nada mais que a estrada.
Hoje, pela noite, passam apenas uivos de revolta,
Poesia abandonada
Vadiando como música excelsa na expressão dorida da escrita,
Decantando a depressão como redenção perversa,
A tinta feita ácido ecoando como badaladas.
Não sei se posso ser assim
Mesmo amanhã quando acordar exactamente igual.
“ Não podias ficar presa comigo
à pequena dor que cada um de nós
traz docemente pela mão”
in Um Adeus Português
Alexandre O’Neill”