Depois de "As Vozes em ti", foi apresentado no passado dia
13 de Dezembro, "Furor das Noites Cheias", de Daniel Costa-Lourenço, o seu segundo livro de poesia.
A obra conta com a colaboração fotográfica de
Paulo César e com prefácio de
António Garcia Pereira e
Possidónio Cachapa.
"À segunda incursão pelo texto poético, Daniel Costa-Lourenço aprofunda as ideias lançadas em “As Vozes em ti”, percorrendo, com um sentimento mais maduro, as interrogações e as visões do mundo urbano, dos desencontros, das dores e euforias da sucessão dos dias, tendo sempre o mar e a cidade como pontos de partida para o que começa e acaba.
Sem nunca conceptualizar ou definir dos sentimentos que explora, assume a constante interrogação sobre o ser urbano, sobre a luta constante do indivíduo em manter-se único na sua apreensão do que o rodeia e do que o une aos demais, importem eles ou não.
Marcam as impressões eufóricas de amar, tristes, desiludidas e prementes, como se fossem as últimas, não porque acabem, mas porque nunca bastam a quem vive intensamente." EDIÇÕES ESCRITA CRIATIVA
Prefácio por Possidónio Cachapa
Este será um prefácio curto sobre um livro de poesia. O que é uma maneira redundante de dizer as coisas, porque a boa poesia tende a ser curta. Dá-se bem com a síntese, parte-se quando a tentam estender pela folha fora. É por isso que os poemas parecem estar sempre em fila. Fragmentaram-se em grãos de areia, porque não são as palavras mais do que isso: grãos de areia que alguns tentam unir, molhados com água do mar, ou com lágrimas que é a mesma coisa mas em ponto pequeno. Seguram a ideia com dedos finos, e retiram-nos cautelosamente esperando que a forma que antes só existia na cabeça, se sustente ali ao menos por um instante.
A poesia de Daniel Costa Lourenço fala destas coisas todas: do cheiro do mar que é o cheiro de um corpo, da necessidade de juntar palavras, de as dizer sem parar antes que a memória-onda as leve. “Uma investida sobre ti e as gaivotas voam rasando a água…” Fala à sua maneira, como consegue. Como todos nós. Parte a rocha dura para que a poesia se extraia. E às vezes extrai-se. E as outras, mesmo se cascalho ou suor, são fruto de esforço honesto que o tempo se encarregará de cobrir. Sempre foi assim com a poesia e há coisas que nunca mudam, como a mineração ou a pesca. Na essência, pelo menos.
Há uma ideia de água que percorre todo o livro. “Maré”, “rio”, “manhã” (cedo). Ou não estivéssemos rodeados dela em Portugal por todos os lados: pelo mar, pela chuva, pelo interior líquido que nos percorre. E há também a partida. Há sempre quem parta. Porque tudo se parte. Mesmo a gente quando se levanta cedo e deixa na cama outro corpo quente.
“A tempestade, única/Conduz ao promontório, /Veloz e impaciente (…) Todos os enganos são previsíveis…”.
Possidónio Cachapa, Lisboa, Outubro de 2006
Prefácio por António Garcia Pereira
Surpresa e Admiração, eis as palavras certas para definir a minha relação com este livro e com o prefácio que me concederam o privilégio de convidar a escrever.
Surpresa, e profunda, antes de mais por tal convite. Pública e notoriamente amante do mar e admirador desse eterno frémito de emoção que são os nascentes e poentes que ele sempre nos propicia, vibrando cada vez que revejo, uma vez mais, a célebre cena do cantar da Marselhesa no filme “Casablanca”, é sabido que não sou propriamente um cultor, muito menos um conhecedor qualificado, de Poesia.
Surpresa, depois, pela impressão, por vezes triste e mesmo desesperada, de outras vezes forte e intensa, quase vulcânica, que a leitura do livro nos vai causando e que, sinceramente, não esperava que fosse tão marcante. E, na verdade, pode eventualmente discordar-se ou desgostar-se de quase tudo nesta obra, dos temas, ou da semântica, ou da métrica, ou até do próprio estilo, Mas que ela nos toca em cordas sensíveis, nalguns casos muito vibrantes, isso creio ser inegável.
Por fim admiração, uma marcada admiração. É que numa sociedade em que todos os dias e em todas as horas se pretendem impor, como valores supremos, o dinheiro, o Poder, a capacidade de enganar ou esmagar o próximo, revela-se absolutamente admirável – para mais num país por vezes imposto como demasiado “pequenino” para nele poder haver lugar à arte, à cultura, à poesia, à sensibilidade, à emoção, ao sentimento e à paixão – que um jovem se decida atirar-se a esse seu sonho que foi, e é, o de fazer um livro de Poesia.
E é por tudo isto que, tendo logo acedido ao honroso convite para escrever estas simples e despretensiosas palavras, acho o autor da obra merecedor de bem mais do que o bastante pouco que tais palavras serão alguma vez capazes de significar.
Lisboa, 9 de Outubro de 2006